ENTREVISTA – Fátima d’Oliveira


Lançámos um desafio aos autores de livros relacionados com a ataxia: responder a uma pequena entrevista. 
A primeira a responder a este repto é Fátima d’Oliveira, autora de “Quando um burro fala, o outro baixa as orelhas”. 
Eis aqui a sua entrevista: 

Fale-nos de si. 
O meu nome é Fátima d’Oliveira e tenho 46 anos. Estou aposentada por invalidez e vivo no Vale de Santarém. 
Escreveu um livro relacionado com a ataxia. Porquê? 
Eu sempre gostei muito de escrever e desde que eu me lembro de ser gente, que sempre quis ser escritora – aliás, tenho dois blogues: “À procura de uma história” (http://aprocuradeumahistoria.blogspot.pt) e “Recatratos” (http://recatratos.blogspot.pt) e tenho participado em várias antologias, quer de contos, quer de poesia. Quando decidi escrever o livro, lembro-me de pensar ‘Porque não?’E, na verdade, foi… catártico. Não é à toa que eu costumo dizer que, para mim, escrever é um ato de exorcismo: é como eu exorcizo os meus demónios.  
Qual a sua relação com a ataxia? 
A minha relação é próxima, mesmo o mais próxima possível: tenho ataxia de Friedreich, uma ataxia hereditária autossómica recessiva – o recessiva tem a ver com a forma de transmissão: nas ataxias hereditárias, há dois grandes grupos: as autossómicas dominantes e as autossómicas recessivas. Nas primeiras, as dominantes, para haver transmissão da doença basta um dos progenitores ser portador do gene mutado (Ex: ataxia espinocerebelosa tipo 3, ou SCA3, também conhecida como a doença de Machado-Joseph). Nas últimas, as recessivas, ambos os progenitores têm que ser portadores do gene mutado, para haver transmissão da doença (Ex: ataxia de Friedreich).  
De que fala o livro? 
Da minha relação com a doença. Da minha história, da minha viagem (uma verdadeira montanha-russa) e de como a ataxia me tocou e mexeu comigoDos meus sentimentos (um autêntico turbilhão), pensamentos e da minha maneira de ver e sentir as coisas. 
E qual o nome do livro? 
“Quando um burro fala, o outro baixa as orelhas” (Chiado Editora, 2010). 
Porquê esse título? 
Eu queria um título que ficasse no ouvido. E lembrei-me deste ditado, que se aplica e adequa perfeitamente. 
Onde se pode encontrar o livro? 
No site da WOOK, https://www.wook.pt/livro/quando-um-burro-fala-o-outro-baixa-as-orelhas-fatima-d-oliveira/4939875. Também me podem contactar diretamente, através de mensagem privada na minha página do Facebookhttps://www.facebook.com/fatima.doliveira.7. Penso ainda que também podem contactar diretamente a editora, Chiado Editora, http://www.chiadoeditora.comPor último, também penso que ainda podem contactar a APAHE, pois penso que ainda devem ter exemplares do livro que doei à associação. 
Já conhecia a APAHE – Associação Portuguesa de Ataxias Hereditárias? 
A minha relação com a APAHE tem início em 2010. De Março/2011 a Março/2014 presidi aos destinos da APAHE. Não continuei pois a minha saúde não o permitiu, mas ainda estou ligada à APAHE: faço parte do Conselho Fiscal. Para além disto, colaboro com a APAHE ao fazer as traduções dos artigos para o blogue (http://artigosataxiashereditarias.blogspot.pt). Mas infelizmente, sou obrigada a cessar esta minha colaboração no final deste mandato (Março/2017), por motivos de força maior. 
O que acha que mais podia ser feito para alertar a sociedade civil para a existência das ataxias hereditárias? 
Existe aquele provérbioQuem não aparece, esquece”. E é o que aqui acontece. Infelizmente, devido à mobilidade dos atáxicos ser muito reduzida e estarem dependentes de terceiros, isso condiciona bastante a sua aparição em ações de sensibilização. E quando conseguem aparecer, são sempre os mesmos, pois são muitos os que, muito pura e simplesmente, recusam-se a dar a cara e aparecer. Seja por vergonha, ou outro motivo qualquer. E o mesmo acontece nas chamadas actividades onlinequantas e quantas vezes a APAHE não organiza uma actividade qualquer online, normalmente um passatempo, onde solicita a colaboração de todos e ninguém (ou quase ninguém) responde e participa? Até parece que estamos sempre à espera que outro apareça e faça alguma coisa. Ora, assim não vamos lá. Se cada um fizer a sua parte, por mais pequena que seja, já estamos a colaborar. É como aquela frase: “Se eu não gostar de mim, quem gostará?”. Se cada atáxico deixar de olhar só para si, parar com a autocomiseração e começar a fazer alguma coisa, por muito pouco que seja, já está a fazer muito: não é à toa que a APAHE tem a frase “Juntos, somos mais!”, pois não nos podemos esquecer que “a união faz a força” e “água mole em pedra dura, tanto dá, até que fura”. Olhem, uma maneira de fazer já alguma coisa e, ao mesmo tempo, combater o isolamento e solidão: juntarem-se à APAHE (http://www.apahe.pt.vu) e tornarem-se sócios. Não só se juntam a outros atáxicos, ultrapassando aquele velho e bem familiar sentimento de serem os únicos, mas também só com mais sócios a APAHE poderá melhor servir os atáxicos, pois a investigação científica deste tipo de patologias está muito dependente do financiamento de terceiros, nomeadamente das associações de doentes e a verdade é que sem sócios para pagar as quotas, não há dinheiro. 
Eu tenho plena e absoluta consciência de que as minhas palavras podem soar duras, ásperas e até cruéis, mas sei bem do que falo: aliás, baseiam-se nminha experiência pessoal: na sua grande maioria das vezes os atáxicos autoisolam-se, por medo. E mergulhados na solidão, desesperam. Eu própria já passei por isso e acreditem-me quando vos digo que de nada valeu: bem antes pelo contrário: foi um total e completo desperdício de mim. 
E às vezes é tão fácil: basta fazerem parte de algo, para se deixarem de sentir tão inúteis e tão perdidos e conquistarem aquele sentimento tão desejado de pertença e valor. 
Tem feito mais alguma em prol da divulgação das ataxias hereditárias? Se sim, o quê? 
Participei, na qualidade de coautora, num projeto literário internacional coordenado pela BabelFAmily (http://www.babelfamily.org/pt/), uma organização internacional que luta contra a ataxia de Friedreich. Esse projeto, que reuniu autores de todo o mundo e todos com ligações à doença, deu origem a um romance original, “El legado de MariSchlau”, já editado em Espanha e cujas vendas revertem a favor de um tratamento e/ou cura para a ataxia de Friedreich. De momento, está-se a trabalhar na edição do livro em inglês, “The legacy of Marie Schlau”. Todo o trabalho, inclusive o processo de tradução, é feito voluntariamente. 
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